“O trânsito de hoje no Brasil é bem diferente que em 1997 e a reformulação do CTB é necessária”, afirma Juscelino Filho

Foi preciso um ano de discussão para que os pontos polêmicos do projeto do governo do novo Código de Trânsito Brasileiro fossem modificados e aprovados pela Câmara

Gil Maranhão

Após um ano de ter chegado no Congresso Nacional, entregue pessoalmente pelo próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acompanhando do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, o projeto de lei de reformulação do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) foi finalmente aprovado esta semana – na quarta, pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Agora será analisado pelo Senado Nesses 12 meses, o texto original do governo, que desde o primeiro momento recebeu críticas severas de políticos, entidades e segmentos diversos da sociedade, sofreu mudanças nas mãos do seu relator: o deputado federal maranhense Juscelino Filho (DEM). A maior dificuldade do relator foi convencer seus próprios pares, os membros da Comissão Especial que analisou o PL 3267/2019, sobre os pontos do seu substitutivo, alguns tidos como polêmicos, que apresentou em outubro. Entre eles, a da validade da CNH, o limite de pontos para suspensão do direito de dirigir, do uso da cadeirinha e do investimento em educação de trânsito. Nesta entrevista exclusiva ao Jornal Pequeno, um dos primeiros veículos a abordar sobre os pontos polêmicos do projeto e do relatório, ano passado, o parlamentar do DEM destaca que precisou construir o texto a várias mãos, fazer mudanças, baseando-se nas opiniões de especialistas e nos anseios da sociedade.

JORNAL PEQUENO – Deste outubro do ano passado seu relatório estava pronto, mas sem consenso para aprovação, na Comissão Especial e no Plenário da Câmara. Como o senhor avalia a aprovação do texto esta semana?
JUSCELINO FILHO – Não tenho dúvidas de que aprovamos um texto com muitos avanços, que atende aos anseios da população e, ao mesmo tempo, prioriza a proteção à vida, a segurança no trânsito e a redução dos acidentes. Foi um substitutivo construído a muitas mãos, com a contribuição de especialistas, entidades, parlamentares e sociedade. Foram várias audiências públicas realizadas no ano passado pela Comissão Especial e reuniões com os atores ligados ao setor, nas quais reunimos todo o conhecimento para elaborar a proposta final.

JP – Uma das críticas que se faz é sobre o momento em que o projeto está sendo apreciado, justamente quando as atenções do País estão voltadas para o combate ao coronavírus.
JF – A reformulação do Código de Trânsito Brasileiro é uma necessidade. Ele vai completar 23 anos em setembro, e o trânsito de hoje é bem diferente do que em 1997. A iniciativa do governo de enviar o PL 3267/19 ao Congresso Nacional foi importante nesse sentido. E a Câmara não deixou de priorizar a luta contra a Covid-19. Já foram aprovadas inúmeras matérias, e é natural que a pauta comece a se abrir para outros temas. Além disso, o debate já estava bastante maduro, em razão de tudo que tratamos na Comissão Especial.

JP – O senhor saudou a iniciativa do governo de enviar o projeto ao Congresso Nacional. Mas o texto original foi bastante contestado, certo?
JF – É verdade. Quando instalamos a Comissão Especial, vários membros defenderam a devolução da matéria. Mas assim que assumi a relatoria, deixei bem claro que eu apresentaria um substitutivo, ou seja, um novo texto. Esse é o papel do Legislativo, melhorar e votar leis, e foi o que fizemos. Às opiniões dos especialistas, se somaram as mais de 300 emendas dos deputados, das quais mais de 100 foram acatadas de alguma forma.

JP – Como ficou a validade da Carteira Nacional de Habilitação?
JF – O texto original estabelecia 10 anos para todos os motoristas até 65 anos. Baseados em dados sobre a evolução de doenças que podem afetar a capacidade de dirigir, propusemos uma escala: 10 anos de validade até os 50 anos de idade, 5 anos para condutores entre 50 e 70 anos, e 3 anos de CNH para aqueles com mais de 70 anos. Mas na perícia para renovação do documento, o médico poderá determinar uma validade menor, caso o motorista apresente alguma situação que indique ser arriscado ele ficar tantos anos sem uma reavaliação do profissional.

JP – Quanto à suspensão do direito de dirigir, o senhor concordou com a ampliação do limite para 40 pontos. Especialistas dizem que se trata de uma flexibilização perigosa. Como o senhor avalia essa questão?
JF – Também nesse quesito, fizemos uma proposta alternativa ao PL original, que estabelecia 40 pontos de teto para todos os motoristas. Entendemos que não seria razoável essa ampliação simples. Então, criamos uma escala: 40 pontos para quem não tiver infração gravíssima no período de um ano, 30 pontos para quem tiver uma multa dessa natureza, e 20 pontos para quem tiver duas ou mais gravíssimas. Assim, beneficiamos o bom motorista e continuamos com regras mais rígidas para os mais infratores. Atualmente, como os condutores estão atingindo os 20 pontos muito rapidamente, os Detrans não estão conseguindo suspender a CNH de todos. Essa nova regra também será importante nessa questão.

JP – E em relação à cadeirinha, discussão tão polêmica, como ficou o texto aprovado?
JF – Aqui temos mais um avanço fundamental. O texto enviado pelo governo substituía a multa para quem transporta criança fora da cadeirinha por uma advertência. Não só mantive a multa como ampliei a obrigatoriedade do uso do dispositivo de retenção, que pode ser o bebê conforto, a cadeirinha ou o assento de elevação. Hoje o critério é apenas a idade, 7 anos e meio. De acordo com o meu substitutivo aprovado, esse uso será obrigatório até a criança completar 10 anos de idade ou atingir 1,45 metros de altura. Tirei esses valores da minha cabeça? Claro que não. Eles estão baseados em estudos sobre a estatura média das nossas crianças e sobre a altura mínima para que elas não sejam estranguladas pelo cinto de segurança, caso ocorra um acidente.

JP – Mais algum ponto que o senhor queira destacar no seu parecer?
JF – Tem duas novidades que colocamos no substitutivo e que são de extrema importância. Um deles é o Registro Nacional Positivo de Condutores, no qual deverão constar os dados dos motoristas que não cometeram infração sujeita a pontuação, nos últimos 12 meses. O objetivo é que esse cadastro possibilite que União, estados, municípios e seguradoras de veículos, por exemplo, possam conceder benefícios fiscais e na prestação de serviços. A outra novidade é a criação e manutenção de escolinhas de trânsito por estados e municípios. Hoje existe o Funset, um fundo que arrecada bilhões com multas, e boa parte dos recursos é para educação. Se já tivéssemos esses investimentos, a realidade em nosso país seria outra. As crianças e os jovens são os futuros condutores, e precisam entender desde já que um veículo, se mal conduzido, torna-se uma arma que pode tirar a vida do próximo.

JP – Após aprovado pela Câmara, qual a sua expectativa para a votação no Senado e sanção presidencial?
JF – É bastante positiva. Como disse, o texto que saiu da Câmara foi construído a várias mãos, com responsabilidade e equilíbrio, baseado na opinião de especialistas e nos anseios da sociedade. Foi um substitutivo bastante elogiado pelos colegas deputados, e acredito que essa será a avaliação dos senadores. E também do governo, que contribuiu nos debates e na aprovação, certamente por entender que trata-se de uma boa proposta.

(Em co-produção com a assessoria)

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